_MEMÓRIAS DE UMA CAIPIRA_

_MEMÓRIAS DE UMA CAIPIRA_

Este espaço virtual, criado em 2008, é fruto de minhas andanças e incursões pelo ofício etnográfico na Ilha de Cananéia, no Vale do Ribeira, Estado de São Paulo, onde pretendo deixar minhas impressões como caminhante, ou tal como diria Helena P. Blavatsky, Lanu.

E no cais se fez história...

E no cais se fez história...
Das memórias imemoráveis dos moradores mais antigos, perpassando por suas bocas seus "causos", saberes e sabores desta ilha, esta caipira mantêm os olhos abertos e a mente relativizadora para fazer-se instrumento de captura dessas histórias de degredados, índias, sereias e sacis que cruzam esta Mata Atlântica e este estuário. Seja bem-vindo a este espaço onde os mitos e lendas que compõem a oralidade caiçara criam e recriam com seus "causos" que se espalharam para além mar. Prepare-se para encontrar tesouros perdidos, passagens secretas, pois a viagem ao imaginário do ilhéu acabou de começar... _Créditos Fotográficos Bianca Lanu_

19 de fevereiro de 2010

O caboclo é bom de enxada

Por Lucas Puntel Carrasco, extraído de Almanaque Brasil, com ilustrações de Laura Andreato


“Entre as raças de variado matiz, uma existe a vegetar de cócoras, incapaz da evolução. Feia e sorna, nada a põe de pé.” Jeca Tatu, de Monteiro Lobato, um caipira dito atrasado e cheio de vadiagem, resolveu garrar na enxada, cuspir na palma da mão e vir espiar o que andam espalhando a respeito da sua pessoa por aí. O caipira é do jeito que é, assim meio quietão, e tem lá suas razões. O sociólogo José de Souza Martins rebate as palavras de Lobato: “O caipira preguiçoso estereotipado contrasta radicalmente com a profunda valorização do trabalho entre as populações caipiras do Alto Paraíba, nas vizinhanças da mesma região montanhosa em que Lobato trabalhou”. Ou seja, quem enxerga o caipira como quem não tem o que fazer deve estar é ruim das vistas. Nunca vi, que nem o sitiante, sujeito tão ligeiro pra carpir uma roça e cuidar dos bichos, nem tão disposto a ajudar a vizinhança num mutirão pra colheita. Cheio de honra na sua palavra, o Jeca recebe de bom grado a mesma ajuda que, a troco de serviço, retribui no sítio dos parceiros. Porque na roça é tudo assim: trabalho é o que não falta e o que se recebe é pra Deus.

Aventureiros sem bandeira

Nada de vadiagem pra quem abriu esse Brasil na enxada e na coragem. O professor Antonio Candido explica melhor: “Da formação histórica de São Paulo resultou uma sociedade cujo tipo humano ideal foi o aventureiro, [...] irmanando-se na vida precária imposta pela mobilidade [...] que deixou no caipira certa mentalidade
de acampamento”. Na beira dos desbravadores do tempo das Bandeiras, o lavrador desbandeirizado foi ficando pelas veredas, capengando no ócio. Marginalizados, se tornariam agregados dos afazendados na cana, fincando pé como sitiantes nas roças de toco, cuidando só do de comer e lavrando assim a raiz da cultura caipira.

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